segunda-feira, 31 de julho de 2017

Principais Grupos Étnicos de Moçambique


Moçambique possui uma rica e longa tradição cultural de coexistência de diferentes raças, grupos étnicos e religiões, ora isto reflecte a diversidade de valores culturais que em conjunto criam as identidades do Moçambique moderno. Apesar de possuir uma diversidade cultural e religiosa diferente de outros lugares raramente serve de razão para gerar conflitos entre os povos de Moçambique.
Com o objectivo de criar uma identidade nacional, o Português foi adoptado como língua oficial depois da independência. No entanto, existem em Moçambique cerca de 20 grupos linguísticos e eles são contrários ao Português largamente falado, especialmente nas zonas urbanas e hoje, cerca de 25% da população fala Português.

A constituição da República de Moçambique estabeleceu o princípio segundo o qual o estado promove o desenvolvimento da cultura e personalidade nacional e garantiu a livre expressão das tradições e valores da sociedade moçambicana.
Efectivamente, a cultura deve ser entendida como um componente determinante da personalidade dos moçambicanos e considera-se a sua valorização como um elemento fundamental para a consolidação da unidade Nacional, da identidade individual e do grupo.
Os povos que habitam actualmente Moçambique são incluídos no grande grupo dos Bantu, que povoa quase toda a África a Sul do Sahara. Dentro deste grupo há muitas sub-divisões, ou etnias. Vejamos algumas noções elementares das principais etnias de Moçambique, divididas, segundo muitos autores, em mais de oitenta sub-grupos.

1. Conceito de etnia

Historicamente, a palavra etnia significa “gentio”, proveniente do adjectivo grego ethnikos. O adjectivo se deriva do substantivo ethnos, que significa gente ou nação estrangeira. É um conceito polivalente, que constrói a identidade de um indivíduo resumida em: parentesco, religião, língua, território compartilhado e nacionalidade, além da aparência física
Um grupo étnico é um grupo de indivíduos que têm uma certa uniformidade cultural, que partilham as mesmas tradições, conhecimentos, técnicas, habilidades, língua e comportamento.
A sociologia Africana, considera que uma etnia  ou um grupo étnico é grupo de pessoas que têm uma herança sociocultural comum, como uma língua e tradições comuns.

Encontramos uma diferença enorme entre Etnia, Tribo, Clã e Linhagem. A sua diferença com a Tribo, surge no facto de que a Tribo referir-se a um conjunto humano que reúne várias famílias sob a autoridade de um mesmo chefe e num espaço territorial dado. A Etnia difere do Clã, visto que este último refere-se a um grupo de pessoas que têm um ancestral comum. Finalmente difere de linhagem, uma vez que esta é uma descendência.

Noutras palavras, os povos ou as populações de ascendência comum constituem etnias; as etnias subdividem-se em tribos, as tribos em clãs e os estes em linhagens. Em todos os países, cada pessoa tem origens étnica, tribal, clânica e de linhagem
Antes da Conferencia de Berlim (Alemanha) de 1885, África era subdivida em Nações verdadeiras cada uma das quais habitadas por pessoas de ascendência comum. Os países africanos resultantes da Conferência de Berlim são compostos de várias etnias, quer dizer de várias nações, culturas e tradições.

2 Principiais grupos étnicos de Moçambique

Em Moçambique, existem diversos agrupamentos humanos com características socioculturais específicas. Ainda não há unanimidade no que se refere a uma designação genérica desses grupos. Por razões óbvias, durante o período colonial esses grupos eram designados por tribos, etnias ou grupos étnicos. O termo povo, embora fosse utilizado por alguns antropólogos e historiadores, não teve um uso sistemático referido a essas entidades.
De acordo com essa informação (MINED, 1986:36), os povos de Moçambique agrupar-se-iam de acordo com uma característica cultural que se apresenta mais ou menos comum em algumas regiões do País: os regimes de parentesco. O rio Zambeze constitui-se numa fronteira natural desses regimes em Moçambique.

A norte daquele rio localizam-se os povos matrilineares: Makonde, Yao, Makhuwa, Nyanja e outros localizados no Zambeze superior, como os Nsenga e os Pimbwe, por exemplo. A sul, encontram-se os povos patrilineares congregados nos seguintes grupos: Shona, Tsonga, Chope e Bitonga. Entre os povos patrilineares figura também o grupo Nguni, cujos núcleos se encontram espalhados pelo País.
No Vale do Zambeze, uma zona de transição, situam-se povos de simbiose das influências matrilinear e patrilinear, dos quais se destacam: Chuwabo, Sena e Nyungwe. Para além dos grupos identificados, existem outros localizados na costa norte, cuja característica particular é a influência patriarcal islâmica que apresentam: são os Mwani.

2.1  Os makondes

Os Makonde localizam-se no extremo norte, junto ao rio Rovuma. Encontram-se igualmente no sul da Tanzânia, em número maior que em Moçambique. Apresentam como traços culturais particulares a escultura em madeira, o uso de máscaras nas cerimónias relacionadas com os ritos de iniciação e a execução da dança tradicional conhecida por “mapico”. Foi em Mueda, centro dos Makonde, que em 16 de Junho de 1960 as autoridades portuguesas reprimiram uma manifestação política da população local assassinando várias centenas de pessoas, fenómeno que passou a ser conhecido na história por Massacre de Mueda. Foi na região dos Makonde, no posto administrativo de Chai, que em 25 de Setembro de 1964 é desencadeada a Luta Armada de Libertação Nacional, 47 anos depois que essa mesma região se constituiu no último foco da submissão à ocupação militar portuguesa.

2.2 Os Yaos

Os Yao, também conhecidos por Ajaua, ocupam a região junto ao lago Niassa e o norte da província com o mesmo nome. Os Yao também se encontram no Malawi e no sul da Tanzânia. Fontes históricas revelam que os Yao eram bastante activos o comércio à longa distância, ligando as regiões do interior com a costa do Índico: Quílua, na Tanzânia, e Ilha de Moçambique. Antes dos finais do século XVIII eram os principais fornecedores de marfim. Segundo Rita-Ferreira (1982:124) os Ajaua transitaram para as formas de comércio internacional com Quílua e Ilha de Moçambique de uma forma gradual, a partir de trocas regionais restritas e regionais de peles, produtos agrícolas e utensílios de ferro até atingir o nível de uma florescente e bem organizada exportação de marfim, nos finais do século XVIII. Rita-Ferreira diz ainda que no primeiro quartel do século XIX os Ajaua tinham-se transformado nos maiores fornecedores de escravos exportados para Mossuril (ibid.:285). Dado o seu contacto regular com a costa de influência muçulmana, os Ajaua islamizaram-se mais cedo que os outros povos do interior. Entretanto, uma islamização significativa viria a acontecer depois de 1890, em  resposta à pressões trazidas pela ocupação colonial (Cf. Ibid.:289).

2.3 Makuwa

Os Makhuwa, por vezes considerados como duas entidades diferentes, constituem a etnia de Moçambique dispersa por um vasto território que no passado se estendia, do rio Zambeze ao rio Messalo, a Sul e Norte, respectivamente, do Oceano Índico, a Este, até à actual fronteira com o Malawi, a Oeste;
Na actualidade, com o centro em Nampula, os Makhuwa-Lomwe espalham-se para partes das províncias de Cabo Delgado, Niassa e Zambézia. Importantes agrupamentos Makhuwa encontram-se também no Madagáscar, no sul da Tanzânia e no Malawi, também a sul. Os Makhuwa reclamam, segundo a tradição, uma origem mítica comum, como comuns são também a sua organização sócio-familiar e a língua que falam. Alguns estudos advogam ser este o grupo bantu mais antigo desta parte da África Austral.
Entre os makuwas, as linhagens familiares estão extensivamente representadas em todo o território [étnico], levando-nos à conclusão do íntimo parentesco existente entre as gentes que constituem aquilo a que tem sido uso apodar de “tribos” Macuas. Igualmente, se encontram as mesmas linhagens familiares (mahimo) em todas as “tribos” Macuas e Lomues, cada qual reportando-se ao mesmo fundador antepassado. O que nos permite reconhecer que todas as chamadas “tribos” Macuas e Lomues são afinal um mesmo povo, embora por vezes assumindo variações regionais (1970:106).

2.4 Maraves

A norte do rio Zambeze, na província de Tete e na parte ocidental da província do Niassa, encontram-se os Marave. Os de Moçambique tomam a designação de Nyanja, enquanto os de Malawi são chamados Chewa.  Para além do Malawi, importantes sectores do povo Nyanja se localizam na Tanzânia, Zâmbia e Zimbabwe. Os Marave são associados ao império do mesmo nome que se desenvolveu nas regiões onde hoje é Zambézia e Nampula, por volta dos séculos XVI e XVIII e que, tal como os Ajaua, se envolveu no comércio de marfim e de escravos. Possuem uma organização matrilinear e tradições culturais particulares.
Junto ao rio Zambeze concentram-se inúmeras etnias com características específicas e exteriores aos grupos étnicos referidos, como são os casos dos Chuwabo, Sena e Nhnungwe, designados habitualmente como “Povos do Baixo Zambeze”.

2.5 Shonas

Os Shona ocupam os territórios entre os rios Save e Zambeze, subdividindo-se em três grupos distintos: Ndau, Manyka e Tewe. De uma forma geral, surgem espalhados pelas províncias de Manica, Tete e Sofala e, ainda, por algumas províncias do Zimbabwe. Esta etnia está associada às ruínas do grande Zimbabwe, entre outros amuralhados de pedra da região.
Shonas ou Xonas são um grupo de povos de línguas bantu que habitam o Zimbábue, a norte do rio Lundi, e no sul de Moçambique. Foram notáveis por suas peças de ferro, cerâmica e música, dentre os quais podem ser destacados os zezuru, karanga, manyika, tonga-korekore e ndau. Com numeração cerca de nove milhões de pessoas, que falam uma série de dialetos relacionados cuja forma normalizada é também conhecida como Shona (Bantu). Um pequeno grupo de imigrantes falando Shona dos anos 1800 também vivem na Zâmbia, no vale do rio Zambeze, na área de Chieftainess Chiawa. O Shona era tradicionalmente agrícola cultivando feijão, amendoim, milho, abóboras, e batata doce.

Os ndaus são um grupo étnico que habita o vale do rio Zambezi, do centro de Moçambique até o seu litoral, e o leste do Zimbábue, ao sul de Mutare. Os ancestrais dos ndaus eram guerreiros da Suazilândia que se misturaram com a população local, constituída etnicamente por manikas, barwes, tewes, nas províncias moçambicanas de Manica e Sofala. A população local do Zimbábue, antes da chegada dos Gaza Nguni, descenderia primordialmente de Mbire, próxima à actual Hwedza. Os ndaus falam um idioma que pertence à família linguística xona, o ndau.

2.6 Bitonga e Chope

Os Bitonga e os Chope concentram-se no sul do país, junto à costa, e nos arredores da cidade de Inhambane, os primeiros, e numa faixa que vai para mais a sul, os segundos que também povoam parte de Gaza, mantiveram ao longo dos séculos uma proximidade cultural com os Tsonga.
Os chopes são dos distritos de Zavala e Inharrime, na província de Inhambane. Este povo viveu tradicionalmente da agricultura de subsistência. Historicamente, alguns chopes foram escravizados e outros tornaram-se trabalhadores migrantes na África do Sul. Os chopes são conhecidos internacionalmente pelo instrumento musical mbila e dança associada, uma manifestação cultural conhecida desde o tempo de Gungunhana, que foi considerada pela Unesco, como Patrimônio Oral e Imaterial da Humanidade. Os chopes identificam-se culturalmente, como povo, com o elefante.

2.7 Os Tsongas

Os Tsongas subdividem-se em três grupos particulares: os Ronga (do extremo Sul até ao rio Limpopo), os Changane (junto ao rio Limpopo) e os Tswa (a norte do rio Limpopo e até ao rio Save). Possuem uma organização patrilinear. Os Tsonga constituem o grupo que, durante os três últimos quartéis do século XIX estiveram sob influência directa do império nguni de Gaza.
Landins ou Vátuas, era o nome genérico dado aos indígenas de Moçambique, a sul do rio Save. Tinham tradições guerreiras sendo o seu último grande imperador, Gungunhana o Leão de Gaza, sido destronado pelos portugueses depois de grandes combates entre 1894 e 1895.
O grupo Tsonga tem continuidades nos territórios da África do Sul e da Suazilândia.

BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA

FERREIRA, Antonio Rita.  Agrupamento e Caracterização Étnica dos Indígenas de Moçambique. Disponível em: http://www.malhanga.com/flipbook/estudos.documentos/

IVALA. Adelino Zacarias. O ensino de História e as relações entre os poderes autóctone e moderno em Moçambique, 1975-2000. Doutorado em Educação/Currículo. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo. 2002

7 comentários:

  1. A minha avó africana era do Xai Xai, bem assim como o pai dela, meu bisavô.
    Ouvi dizer que eu era Changane e também sei que o meu apelido africano é Zuon (ou Zwon, no caso se ser ortogarafado à inglesa). Nas poucas pesquisas que fui capaz de saber, ouvi dizer que este povo se terá miscigenizado com os zulus, que os invadiram e ocuparam -- o que, a ser verdade, significará que as minhas origens africanas mais remotas serão na província do Natal, na África do Sul, dada pelos estudiosos como o território de origem dos zulus. Por outro lado, gostava de saber se o meu apelido africano poderá responder a estas minhas questões.
    se alguém souber responder-me, poderá fazê-lo para o meu email: mariajoaovicente1@gmail.com
    Muito obrigada

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  2. Engraçado que tenho o mesmo problema na minha família nem sei bem qual a etenia de que descendo. minha avó materna quase de certeza que era Bitonga. mas minha bisavó também materna devia ser changane. Sei que os vátuas ou Landins seriam descendentes de Povos Zulos...a documentação nesses anos não são muito concisos e na verdade houve bastante misturas o que dificulta e pode originar erros, os registos perdem-se ou não existem. Complicado ajudar sem cometer erros.aanmu@sapo.pt

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  3. E uma mensagem tão importante para o povo de mocaMoçamb

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  4. Informação bem detalhada, forte e profundo!

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